domingo, 30 de junho de 2013

NA FOLHAGEM DAS OLIVEIRAS



                               "mulher pássaro" ósseo de Graça Morais



Há tantos anos
que te não via os olhos
de tão perto os conhecer

foi preciso um pássaro
ajudar-me a fazer lume

rasgar janelas
na direcção do vento

e com um fósforo
atear fogueiras
só para os ver

lá estavam
na folhagem das oliveiras



 

sexta-feira, 28 de junho de 2013

NA ESCURIDADE DAS MARÉS VIVAS






No entardecer da praia-mar
desprendidos barcos
invadiram a rota das águas

hastearam-se em coro
num sonho navegável

Povoadas as margens
quando de novo
as palavras sangraram
na escuridade das marés vivas

um pássaro poisou
nas tuas mãos
para o levares aos lábios


 

terça-feira, 25 de junho de 2013

NOVO IMPULSO






CADA APEADEIRO
UM NOVO IMPULSO
PARA A VIAGEM
DESGOVERNO RUA JÁ

 

sábado, 22 de junho de 2013

ROUBEM-ME TUDO






Roubem-me tudo
os lápis de cores
as minhas flores preferidas

mas não me roubem
os olhos por onde vejo
um mar que não se verga

Roubem-me tudo
menos um verso

 

terça-feira, 18 de junho de 2013

PÁSSAROS LIVRES DARDEJAM NOS MASTROS





Num sopro de remos e passos
tento dar às palavras
a leveza das cinzas

silêncios expostos
derramados
na fissura das pedras
para agigantar em campânula
as paredes da casa

mas quando abro o portão
do cais
e solto os cães
para ouvir a escarpa
só os pássaros livres
não deixam de cantar

dardejam
nos mastros
para os barcos se moverem

 

quarta-feira, 12 de junho de 2013

ATÉ AO INICÍO DAS MÃOS



                                                         ( Reeditado)



Já tinham colhido as flores do jardim
mas tu cumprias um caminho
desaguavas como um rio
e eu não sabia que respiravas
à flor da pele
por todos os póros

Muito antes de me ajudares
a plantar uma árvore
procuraste a margem

Tão líquida por entre os dedos
construíste um corpo uníssono
contra todos os destinos

Encontrei-te com um simples toque
numa folha de papel
a vaguear no espelho das águas

dedos nos dedos
até ao início das mãos


 

sábado, 8 de junho de 2013

CORPO DE ASAS





Queria ver uma multidão
uníssona
em cada gesto teu
e vejo

Queria que tivesses um oceano
organizado
no azul dos olhos
e tens

Queria que fosses um corpo de asas
mas insistes em chamar às coisas
apenas o nome que elas têm

 

domingo, 2 de junho de 2013

A MEMÓRIA DAS PEDRAS





Quando a noite luz
ateio-me
num abraço de limos
escrevo em branco
onde se movem
sombras de pássaros
pétalas soltas
mares desgrenhados
na cadência do relógio de pêndulo

Pelas frinchas
oiço perfeitamente
o vento que faz
o uivo dos cães
o ranger das gáveas
o despontar em surdina
de novas flores no cais

Escrevo em branco
para não ficarem sem memória
as paredes da casa