terça-feira, 27 de agosto de 2013

POEMAS OU QUASE NADA



                                         foto de Eduardo Gageiro


Observo como se move
a água do meu rio

desprendida
sem mácula nem lágrimas
nua de tudo
passo a passo
militante da vida
e verdades improváveis

com todo o tempo
para sonhar
move-se lenta
esculpe caminhos
muito antes de ser mar

Um dia sonharei
um sonho seu

acordarei uma vez mais

a fazer poemas
ou quase nada


 

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

AS SEARAS






É o sol que desponta
quando acendo um fósforo
e vejo como se movem as sombras
quando luz
e desfolha a noite
num sopro de lume

é o sol a raiar
que se deita no chão
despido de pétalas
a ouvir pássaros de ninguém
improvisarem hinos na folhagem

é o sol que se ateia silvestre
muito antes de ser dia

mas nem assim troco as tuas flores
por outras bandeiras
nem os teus lábios
por outros jardins

mesmo que o outro sol
adormeça de cansaço

as searas


 

sábado, 17 de agosto de 2013

LINDOS SÃO OS DESERTOS






Cansada de vicejar sardinheiras
na varanda do cais
afagar solidões
e outros desamores
desceu ao sopé da escarpa
desvendou-se
num coração de ave

reacendeu-se
no caminho do fogo
derivado ao vento
construiu um barco
sem pátria conhecida
e escreveu
nas paredes da casa

lindos são os desertos
cheios de gente

 

domingo, 11 de agosto de 2013

NO OUTRO LADO DO SILÊNCIO




Se o Verão fosse um rasto de luz
com vida por dentro
um livro aberto sem repouso
alguém teria de lhe rasgar o ventre

mas o Verão é apenas sol
a queimar o que resta do pasto

tresmalhado pastor
rebanho sem memórias
um chão que dorme
à sombra do cajado

Que importa o Verão
se o teu corpo é de tempestades
e até parece que há sempre algo
que me pertence em ti
só de pensar
a pedra sobre a pedra
o verso e o anverso

Que importa o Verão
se o sol queima
e os cães ainda não acordaram
as sombras que ladram
estateladas
no outro lado do silêncio

 

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

URBANO TAVARES RODRIGUES UM HOMEM INTEIRO




Urbano Tavares Rodrigues, uma bandeira de cidadania e honra.
Um Homem inteiro - alentejano, escritor e comunista.
Uma voz que o fascismo não calou nem o regime democrático revelou como merecia.
O nosso Urbano, jornalista, crítico literário, e professor catedrático - legou-nos uma vastíssima obra para gerações de leitores.
Conheci o nosso Urbano pessoalmente e com ele fico - Homem generoso, sábio e firme nos valores universais que sempre defendeu.
Permito-me recomendar o seu "Bastardo do Sol " .
Não deixemos morrer os nossos mortos.

 

terça-feira, 6 de agosto de 2013

PÁSSAROS SILVESTRES





Nos subúrbios de tudo
mesmo junto aos meus olhos
desenham garatujas
no ar que se respira

em desassossego
num clamor de marés
voam de boca em boca
sem destinos

alimentam-se em pleno voo
de pequenos nadas
essenciais
para continuarem a ser pássaros

Estou a vê-los
aqui tão perto
que nem lhes posso tocar

de tão silvestres