quarta-feira, 29 de novembro de 2017

TUDO SE MOVE





Com tantos mares desnavegados
começámos a desbravar
caminhos repetidos
quase perfeitos
o fulgor das velas no cais

na verdade
já tínhamos nascido
desnascido quase tudo

quase tudo
porque ainda hoje
nas nossas veias
os rios correm para o mar
a chuva cai dos céus
movimenta-se
a memória das pedras

águas ventos cumplicidades
num abraço de limos

tudo se move
mas "sem a claridade dos pássaros
o poema não voa"


Eufrázio Filipe


sábado, 25 de novembro de 2017

SIMPLESMENTE CHOVIA





Nestes dias
há deuses de caruma
que se agitam
no coração dos pássaros
lágrimas soltas
na boca das sementes
numa festa de faúlhas

fui a janela
para ver

fiquei mais leve de palavras

simplesmente chovia


Eufrázio Filipe

sábado, 18 de novembro de 2017

SOL DE MÃOS CHEIAS






Com tantas pedras partilhadas
aqui estamos soltos
na vertigem da escarpa
a plantar árvores
com vistas para o mar

Aqui neste Outono
para meu espanto
despontam camélias
no bico dos teus seios

um sol de mãos cheias
no trilho  dos pássaros silvestres

e nós desvendamos
caminhos que resistem

como se fossemos livres
e somos
de tão breves


Eufrázio Filipe

segunda-feira, 13 de novembro de 2017

O INICIO DO MAR






Em que chão assenta
o coro polifónico
da chuva miudinha?
em que chão o rio
se desprende
das magras águas?

passo a passo
onde arde na praia
sempre azul
o inicio do mar


Eufrázio Filipe


terça-feira, 7 de novembro de 2017

ROSA FOLHEADA






Amanheci
a desenhar
o teu corpo
a desfolhar
uma rosa

porque não uma rosa?

todas as flores 
se desfolham

também tu Rosa


Eufrázio Filipe
editora Temas originais 
Para lá do Azul


quarta-feira, 1 de novembro de 2017

SINAIS DE PENAS






Cumprida a colheita
decepadas as videiras
sem lágrimas soltas
na mesa redonda
do alpendre
só há lugar cativo
para os pássaros

timbres
mais leves que as cinzas
sopros de vento
na folhagem desprendida

Aqui em torvelinho
se deitam
os deuses do costume
que não dormem
palavras desalinhadas
sinais de penas


Eufrázio Filipe